Medidas reduzem carga sobre lucro apurado no exterior e valem até dezembro;
Receita diz defender prorrogação e que governo estuda tema
Debate sobre tributação de múltis: incerteza sobre a renovação dos mecanismos traz insegurança às empresas — Foto:
Leo Pinheiro/Valor
A proximidade do vencimento de dois mecanismos que reduzem a carga tributária sobre o lucro das multinacionais brasileiras está gerando apreensão no setor. As empresas estão pedindo a renovação desses mecanismos e sua adaptação às normas internacionais, e especialistas alertam que a incerteza pode levar multinacionais brasileiras a migrarem para outros países. Técnicos da Receita Federal também se mostraram favoráveis à extensão dos mecanismos, e o governo está analisando a questão.
Esses mecanismos foram instituídos pela Lei 12.973, de 2014, com prazo inicial até dezembro de 2022, e posteriormente prorrogados pela Lei 14.547/23 até o final deste ano. O primeiro é o crédito presumido de 9%, que permite que a controladora brasileira deduza um crédito presumido de 9% do lucro apurado por indústrias controladas no exterior. O segundo mecanismo permite a consolidação dos resultados das controladas no exterior para cálculo do Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), permitindo compensação entre lucros e prejuízos, reduzindo a base de cálculo e os tributos devidos. Juntos, esses mecanismos compõem a chamada Tributação em Bases Universais (TBU).
A advogada tributarista Ana Cláudia Akie Utumi, sócia do escritório Utumi Advogados, destaca que a incerteza quanto à renovação desses mecanismos traz insegurança para as empresas, especialmente porque uma legislação sobre o tema só poderia ser sancionada em 2025. Ela aponta que a falta de continuidade nos mecanismos incentiva a transferência de investimentos para fora do Brasil. Utumi cita o exemplo de empresas como Nubank, Ebanx, Creditas e Hotmart, que, embora tenham surgido no Brasil, hoje possuem sedes em outros países.
Para empresas com sede no exterior, a tributação do IR no Brasil pode ser de 15%, incentivando a escolha de outras jurisdições e impedindo o crescimento de multinacionais genuinamente brasileiras. Mário Sérgio Teles, superintendente de economia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), defende a renovação imediata da TBU e sugere que se busque, em seguida, uma solução definitiva que inclua as normas de Controlled Foreign Company (CFC) e as Regras Globais contra Erosão da Base Tributária (GloBE), recentemente introduzidas na legislação brasileira pela MP 1.262/24, que prevê uma tributação mínima de 15% sobre lucros de multinacionais que faturam acima de 750 milhões de euros.
O deputado Luiz Gastão da Silva (PSD-CE) argumenta que a tributação mínima de 15% deveria ser discutida por meio de projeto de lei, e não de medida provisória. Pablo Cesário, presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), critica a TBU, afirmando que ela coloca as empresas brasileiras em desvantagem competitiva e que o fim da prorrogação, em 31 de dezembro, agravará essa situação.
Por outro lado, Daniel Prates, coordenador de tributação internacional da Receita Federal, afirmou que a Receita não se opôs à prorrogação dos mecanismos em 2022 e também é favorável à prorrogação atual. Ele lembrou que, na época, a renúncia fiscal estimada foi de R$ 4 bilhões e foi incluída no orçamento. Prates acrescentou que a equipe técnica da Receita discutiu a prorrogação dos mecanismos durante a elaboração da MP 1.262/24, mas a proposta foi excluída do texto final. O impacto fiscal da prorrogação seria sentido apenas em 2026, e o tema ainda está sob análise do governo.
As declarações foram feitas na última sexta-feira, dia 8, durante o debate “Tributação de Multinacionais Brasileiras”, promovido por Itaú e Valor Econômico.
Fonte: Valor.globo.com